De: Mauro Faria de Lima
Enviado: quinta-feira, 9 de maio de 2013 16:50
Assunto: Carta Aberta.
CARTA ABERTA À DEPUTADA FEDERAL ÉRIKA KOKAY
EXMA SRA DEPUTADA FEDERAL
Vossa
excelência tem um trabalho longo e coerente na defesa dos Direitos
Humanos, principalmente das minorias. Foi assim desde os tempos da
Câmara Legislativa do DF. Na Presidência da Comissão de Direitos Humanos
da CLDF, fui testemunha do vosso empenho e despreendimento. Recebi
inúmeros ofícios de V. Exa. noticiando, solicitando e cobrando apurações
e denúncias contra agentes do aparelho repressor do Estado que agiam em
ofensa aos Direitos Humanos. Foi assim, só para lembrar, no caso da
Cavalaria jogada sobre os estudantes da UNB, que manifestavam no “FORA
ARRUDA”. Foi assim no caso das famílias perseguidas por PMs em Santa
Maria-DF. Foi assim no caso das revisões das L200 da PMDF. Foi assim no
caso dos moradores de rua da rodoviária, perseguidos pela polícia que
fazia uma “limpeza urbana”. Foram inúmeros os casos que atendi, em
cumprimento de meu dever, os pleitos de V. Exa.
Só
que agora, Deputada, esse poder-dever que ainda detenho está seriamente
ameaçado: caso seja aprovada a PEC 37, o Ministério Público estará
proibido de investigar e apurar crimes, inclusive violação dos direitos
Humanos! Somente as polícias civis e federal poderão investigar!
Por
experiência própria, bem sabe V. Exa., que os maiores violadores dos
Direitos Humanos de primeira geração são os agentes públicos, em
especial os órgãos de segurança pública (as polícias).
Ao
longo dos anos, as polícias têm se notabilizado pelas violações de
Direitos Humanos (vida, integridade corporal e liberdade), mas não têm
sido elas -as polícias - assim tão ciosas na apuração e
responsabilização dos seus agentes, quanto o são em sua defesa
corporativa. Merecem esse privilégio da PEC 37?
A
polícia brasileira, como um todo, é violenta e uma das que mais matam
no mundo. Os organismos e entidades internacionais de proteção dos
Direitos Humanos preconizam, como forma de se evitar essas violações,
que o Ministério Público tenha uma participação mais ativa na persecução
penal e no controle da polícia. Na contramão disso tudo está a PEC 37,
patrocinada, certamente, por deputados-delegados e políticos ressentidos
com a atuação do Ministério Público.
Pode
ter havido, e certamente houve, excessos por parte de alguns membros do
Ministério Público. Isto, porém, não pode servir de pretexto para se
aniquilar uma instituição tão cara à sociedade brasileira, como é o
Ministério Público. Se assim fosse, o próprio Parlamento brasileiro
talvez sucumbisse ao veredicto popular, que o identifica com as mazelas
que teimam em recair sobre o povo brasileiro. Uma injustiça: não há
democracia sem Parlamento, o mais transparente de todos os poderes.
A
PEC 37, Deputada, constitui uma anomalia em nosso sistema jurídico: ela
impede a que a parte que deduz em juízo uma pretensão, busque as provas
em que se baseia. Impede o Ministério Público de buscar suporte para a
acusação e a defesa de buscar elementos para a própria defesa do
imputado! Assim, as partes processuais – acusação e réu – e o Juiz, os
chamados sujeitos processuais, passam a depender única e exclusivamente
da polícia, ou seja: no processo penal um agente administrativo do
estado -a polícia- comanda a acusação, a defesa e o Juiz! É o monopólio
do processo penal.
Tudo isso se baseia
no ardiloso e fraudulento argumento de que assim se garante os direitos
individuais, por que a polícia tem que ser imparcial.
Ora,
se tomarmos o termo como “não ser parte”, portanto, imparcial, a
polícia já o é, pois a polícia efetivamente não é parte processual e nem
sujeito. É apenas um órgão administrativo que apura autoria e
materialidade dos crimes. Não lhes cabe julgar. Portanto, de nenhuma
valia a imparcialidade e outros atributos buscados pelos órgãos de
repressão do Estado.
Caso a PEC 37 seja
aprovada, ficará muito difícil, talvez impossível, responsabilizar os
violadores dos Direitos Humanos em sede penal, principalmente se a
violação partir dos próprios policiais.
Desta
feita, solicito de V. Exa. tão conhecedora do assunto, gestões junto à
Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, objetivando a
rejeição dessa anomalia jurídica, monstruosidade política, desvio ético e
desastre moral que a PEC 37.
Mauro Faria de Lima
Promotor de Justiça
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