A notícia do estupro de uma jovem de 23 anos por seis homens em um
ônibus em Nova Délhi chocou o mundo e jogou luz sobre o problema da
impunidade contra esse crime na Índia. Os registros mais recentes do
Brasil, no entanto, mostram que somente entre janeiro e junho de 2012 ao
menos 5.312 pessoas sofreram algum tipo de violência sexual.
O número representa uma queda de 28% em relação a 2011, mas um
crescimento de 54% em relação ao mesmo período de 2009. Essa estatística
inclui os casos de estupro, assédio sexual, atentado violento ao pudor,
pornografia infantil, exploração sexual e outros crimes sexuais. Em
média, a cada dez casos, 8,5 são contra mulheres. No caso específico de
estupros, de 2009 a 2012, houve crescimento de 157%.
Até 2009, o Código Penal só tratava como estupro a agressão com
penetração vaginal comprovada. O toque e até a penetração anal eram
tratados como atentado ao pudor. A mudança na lei, na avaliação de
Aparecida Gonçalves, secretária nacional de Enfrentamento à Violência
contra as Mulheres, encorajou as mulheres a denunciar as agressões,
influindo sobre as estatísticas.
— As mulheres estão tendo mais coragem de denunciar, elas estão se sentindo menos culpadas — avalia Aparecida.
O Ministério da Saúde diz que os casos de violência passaram a ter
notificação obrigatória em todos os serviços de saúde apenas em 2011, o
que contribui para o aumento da quantidade de casos. Aparecida ressaltou
o aumento dos estupros coletivos no país, especialmente em festas. Em
agosto de 2012, os dez integrantes de uma banda de pagode teriam
estuprado duas adolescentes após um show na Bahia. Em fevereiro do mesmo
ano, cinco mulheres foram estupradas, das quais duas morreram, em uma
festa em Queimadas, na Paraíba. Nove homens foram detidos.
A secretária diz que os movimentos em defesa das mulheres têm usado
bem as redes sociais para protestar. As ONGs teriam conseguido, por
exemplo, evitar a contratação da banda de pagode para eventos e até
retirar o patrocínio de empresas ao grupo.
— Não tem revolta como teve na Índia. Mas existe um outro tipo de
mobilização no Brasil que tem funcionado, que são as redes sociais —
avalia Aparecida.
Se os casos se contam aos milhares no Brasil, entidades de defesa da
mulher advertem que a punição ainda é muito baixa, apesar do aumento
progressivo das denúncias que chegam à polícia. Segundo o Ministério da
Justiça, há no Brasil 12.704 presos por estupro — 99,2% são homens. Há
ainda 8.005 presos por atentado violento ao pudor e 665, por corrupção
de menores.
Leila Linhares Barsted, coordenadora executiva da Cepia, uma ONG que
atua contra a violência sexual, acredita que um dos motivos da
impunidade é o baixo índice de mandados de prisão cumpridos neste tipo
de crime.
— Uma coisa é a polícia mandar prender, outra coisa é o indivíduo ser
achado para ser preso — afirma Leila, ao concordar que as mulheres
estão mais encorajadas a denunciar seus agressores. — De fato, muitas
mulheres estão mais corajosas para denunciar. Quanto mais se divulgam
informações sobre direitos e quanto mais se oferecem serviços, vai
aparecer mais violência. O que acontece é que o aumento da demanda das
vítimas aos serviços públicos dá visibilidade maior aos crimes.
Proporcionalmente ao número de habitantes, o Rio de Janeiro tem o
menor índice de estupradores presos: 1,4 por 100 mil pessoas. Já Roraima
está em primeiro lugar: são 26,15 presos por estupro para cada 100 mil
habitantes.
No estado do Rio, 16 estupros por dia
Se os dados do SUS apresentam um aumento nas notificações, os dados da Secretaria de Segurança do Rio apresentam números ainda mais assustadores. De janeiro a outubro do ano passado, foram registrados 5.055 casos de estupro, mais do que as 4.022 ocorrências, registradas entre janeiro e dezembro de 2011, segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP).
Se os dados do SUS apresentam um aumento nas notificações, os dados da Secretaria de Segurança do Rio apresentam números ainda mais assustadores. De janeiro a outubro do ano passado, foram registrados 5.055 casos de estupro, mais do que as 4.022 ocorrências, registradas entre janeiro e dezembro de 2011, segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP).
Em 2012, houve, em média, a ocorrência de 16 estupros por dia no
estado. Os agressores mais frequentes são amigos ou conhecidos, com
1.333 registros; o pai, com 447; e o padrasto, com 444.
Para enfrentar as agressões sexuais no país, a Secretaria Nacional de
Políticas para as Mulheres tem investido em duas frentes: campanhas
educativas para atingir principalmente crianças e adolescentes, uma vez
que o agressor normalmente é um parente ou conhecido da família; e
fortalecer os serviços de atendimento públicos disponíveis para a
vítima, como as delegacias e os profissionais nos hospitais e postos de
saúde.
— Isso mostra o comportamento machista da nossa sociedade, que
autoriza que homens se apropriem do corpo da mulher. É como se o homem
não pudesse ouvir o não. Se a sociedade não começar a reagir, nós logo
vamos estar numa situação como a da Índia —afirmou Aparecida.
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