*Clóvis Mendes
A criação do Conselho Tutelar foi uma das inovações que o
Estatuto da Criança e do Adolescente trouxe. E andou bem o legislador,
idealizando uma gestão participativa da própria comunidade, inclusive com a
criação simultânea dos conselhos e fundos de direitos da criança e do
adolescente. Antes, o legislador constituinte, acolhendo uma concepção moderna
de defesa da criança e do adolescente, estabeleceu como princípios básicos a
participação popular e a municipalização do atendimento àqueles. A
Constituição da República, no art. 227, § 7º, prevê que "no
atendimento dos direitos da criança e do adolescente levar-se-á em
consideração o disposto no art. 204", o qual assegura, dentre outras
diretrizes, a "participação da população, por meio de organizações
representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em
todos os níveis" (inc. II).
Nas discussões do anteprojeto de lei que deu origem ao
Estatuto, pensou-se na necessidade de um órgão popular que distribuísse
justiça social, célere e com um mínimo de formalidade, voltado a resolver, no
próprio município, as questões relacionadas com violação dos direitos
fundamentais das crianças e adolescentes.
Verdadeira instância administrativa, segundo Paulo Afonso
Garrido de Paula [1], o órgão foi criado para zelar pelos direitos da criança
e do adolescente. Não existe como mera formalidade ou criação burocrática,
apenas para "empregar" pessoas e ser mais um órgão do aparelho
estatal. Conquanto a sociedade e o próprio poder público ainda teimem em não
aceitá-lo – e isso implica acatar as decisões, prover os meios de
funcionamento, participar do processo de composição etc – os conselhos
tutelares são realidade. Chegaram para ficar e aí estão, mesmo que ausentes
em muitos municípios. E a experiência tem mostrado que, mormente para seus
principais destinatários, o órgão muito tem feito e contribuído de maneira
eficaz para a implementação dos direitos constitucionalmente garantidos.
Antes deles, as questões sócio-jurídicas relacionadas a
crianças e adolescentes desaguavam nas antigas varas de menores, que acumulavam
funções diversas, como a de punir, acolher, encaminhar para uma família
substituta, entre outras. O antigo "juiz de menores" assumia tarefas
de juiz, de pai, de policial, de assistente social, em compasso com a então
vigente Doutrina da Situação Irregular, que tinha em mira crianças e
adolescentes mendigos, abandonados, infratores, andarilhos e outros
"menores" em "situação irregular".
Como explica o Juiz de Direito Judá Jessé de Bragança
Soares, "O Conselho Tutelar não é apenas uma experiência, mas uma
imposição constitucional decorrente da forma de associação política adotada,
que é a Democracia participativa ("Todo o poder emana do povo, que o
exerce por meio de representantes eleitos, ou diretamente, nos termos desta
Constituição"), e não mais a Democracia meramente representativa de
Constituições anteriores" [...]. E ainda: "O Estatuto, como lei
tutelar específica, concretiza, define e personifica, na instituição do
Conselho Tutelar, o dever abstratamente imposto, na Constituição Federal, à
sociedade (CF, art. 227). O Conselho deve ser, como mandatário da sociedade, o
braço forte que zelará pelos direitos da criança e do adolescente" [2].
E é sobre as atribuições desse magnífíco instrumento de
proteção à criança e ao adolescente que se discorrerá neste texto,
abordando-se, em síntese, o Título V da Lei Federal nº 8.069/90 (Estatuto da
Criança e do Adolescente), além de outras disposições correlatas.
Das atribuições
O artigo 136 do Estatuto da Criança e do Adolescente enumera
as atribuições do Conselho Tutelar. São funções de caráter administrativo
e sócio-assistenciais, não se impregnando de juridicidade, conquanto o órgão
deva se ater ao princípio da legalidade.
O Conselho Tutelar exerce uma parcela do Poder Público,
conforme disposto no art. 1º, par. ún., da Constituição Federal, poder este
não jurisdicional (cf. art. 131, ECA). Ele pode promover a execução de suas
decisões, requisitar serviços públicos, representar ao juiz em caso de
desobediência injustificada e, inclusive, assessorar o Poder Executivo na
elaboração de proposta orçamentária no tocante ao atendimento dos direitos
da criança e do adolescente.
Passo aqui a analisar as inúmeras atribuições dispostas no
art. 136 do ECA.
I - atender as crianças e adolescentes nas hipóteses
previstas nos arts. 98 e 105, aplicando as medidas previstas no art. 101, I a
VII;
Trata-se da competência para aplicação de medidas
protetivas à crianças e adolescentes quando ocorrer violação por ação ou
omissão da sociedade ou do Estado, por falta, omissão ou abuso dos pais ou
responsável e em razão da conduta da criança ou do adolescente (art. 98, ECA).
No caso de ato infracional praticado por adolescente, a
competência para aplicação de medida sócio-educativa é do Juízo da
Infância e da Juventude (148, I, ECA), ao passo que em se tratando de ato
infracional cometido por criança, caberão apenas medidas protetivas, a cargo
do Conselho Tutelar (art. 105, ECA).
O Conselho Tutelar poderá aplicar as seguintes medidas, sem
prejuízo de outras (art. 101, ECA): I. encaminhamento aos pais ou responsável,
mediante termo de responsabilidade; II. orientação, apoio e acompanhamento
temporários; III. matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento de
ensino fundamental; IV. inclusão em programa comunitário ou oficial de
auxílio à família, à criança ou adolescente; V. requisição de tratamento
médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial;
VI. inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e
tratamento à alcoólatras e toxicômanos; e VII. abrigo em entidade.
Sobre o tema: "AGRAVO DE INSTRUMENTO – Nulidade
inocorrente – Medida tomada pelo Conselho Tutelar, em caráter preventivo –
Retirada de recém-nascido do convívio materno, nos estritos limites previstos
na lei – Aplicação do artigo 101, VII do Estatuto da Criança e do
Adolescente – Improvimento dos agravos" [3].
II - atender e aconselhar os pais ou responsável, aplicando
as medidas previstas no art. 129, I a VII;
Tais medidas são: I - encaminhamento a programa oficial ou
comunitário de proteção à família; II - inclusão em programa oficial ou
comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e
toxicômanos; III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;
IV - encaminhamento a cursos ou programas de orientação; V - obrigação de
matricular o filho ou pupilo e acompanhar sua freqüência e aproveitamento
escolar; VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento
especializado; VII – advertência.
Aqui, "a atribuição do Conselho Tutelar é de realizar
um trabalho educativo de atendimento, ajuda e aconselhamento aos pais ou
responsável, a fim de superarem as dificuldades materiais, morais e
psicológicas em que eles se encontram, de forma a propiciar um ambiente
saudável para as crianças e os adolescentes que devem permanecer com eles,
tendo em vista ser justamente em companhia dos pais ou responsável que terão
condições de se desenvolver de forma mais completa e harmoniosa" [4].
III - promover a execução de suas decisões, podendo para
tanto:
a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde,
educação, serviço social, previdência, trabalho e segurança;
As situações previstas no presente inciso deixam latente a
variada gana de funções que possui o Conselho Tutelar. Atualmente, ele é o
primeiro órgão público procurado pelas pessoas (pais, crianças e
adolescentes, servidores públicos, entidades etc) quando se trata de violação
a direitos de crianças e adolescentes, mesmo quando tais violações
caracterizem ilícito penal.
E é justamente para bem exercer tais funções e cumprir seu
papel que o Conselho Tutelar foi provido, pela lei, de ferramentas hábeis e
mecanismos capazes de emprestar força para o alcance de sua finalidade.
Na primeira situação, se vê que o órgão pode requisitar
inúmeros serviços. No caso da saúde, pode requisitar o atendimento urgente de
uma criança, cuja consulta ou exames necessários estejam sendo protelados por
alegada "falta de vaga", cabendo a "requisição de tratamento
médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial"
(art. 101, V). No tocante à educação, é conhecidíssima a ação do órgão
em requisitar vagas em escolas ou creches, até mesmo para cumprir a medida de
matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino
fundamental" (art. 101, III). Pode requisitar a inclusão de criança e
adolescente em programa assistencial e de inclusão, bem como atuar junto ao
INSS no sentido de ver concedido benefício assistencial à criança deficiente,
cujos genitores estão encontrando obstáculo ao deferimento. No campo do
trabalho e segurança, p. ex., pode exigir do Ministério do Trabalho que
fiscalize empresas que submetem adolescentes a trabalhos penosos, insalubres ou
de reconhecida periculosidade, ou em desacordo com a idade mínima fixada pelo
art. 7º, XXXIII, da Constituição Federal.
O Estatuto usa o termo requisitar, que significa ordenar,
"exigir legalmente" (ELIAS, 1994, p. 116). Não pede, apenas. Está
explícito, portanto, o poder do órgão e a obrigação do destinatário da
requisição em atendê-la, salvo justo motivo a ser verificado no caso
concreto. Caso houve, no município de Junqueirópolis, que o Conselho Tutelar
requisitou vaga em escola pública para dois alunos na 5ª série do ensino
fundamental e o responsável pela escola se negou a atender alegando falta de
vagas. Levado o caso ao Ministério Público, este constatou que, na época,
haviam vagas, e determinou a instauração de inquérito para apurar ilícito
penal e procedimento para apurar infração administrativa.
"Com efeito, o Conselho Tutelar não executa suas decisões, mas promove, indica, determina que suas deliberações sejam cumpridas pelas entidades governamentais e não-governamentais que prestam serviços de atendimento à criança, ao adolescente, às famílias e à comunidade em geral, caracterizados pela essência da assistência social, nas diversas áreas" [5].b) representar junto à autoridade judiciária nos casos de descumprimento injustificado de suas deliberações;
Essa representação pode ser aquela que dará início a
procedimento para apurar a infração administrativa do art. 249 [6] do ECA,
conforme disposto no art. 194 [7] do estatuto.
Rose Mary de Carvalho lembra: "Uma coisa é certa: as
decisões do Conselho Tutelar postas a serviço dos interesses da criança e do
adolescente não podem ficar no papel, como letra morta, pois, havendo
descumprimento injustificado de suas deliberações, pode o Conselho Tutelar
representar junto à autoridade judiciária, para fazer com que suas decisões
sejam respeitadas" [8].
IV - encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que
constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança ou
adolescente;
"O Conselho, de posse de informações da existência de infrações administrativa ou penal contra os direitos da criança e do adolescente, deve dar ciência do fato ao Ministério Público, para que sejam tomadas as providências cabíveis" [9].
A comunicação de fato caracterizador de infração penal é
plenamente justificada, por força do poder-dever do Ministério Público de
requisitar a instauração de inquérito policial (art. 5º, II, CPP). E de
posse das peças de informação enviadas pelo Conselho Tutelar, poderá, se for
o caso, oferecer denúncia desde já.
Entretanto, no que tange às infrações administrativas, só
cabe a remessa ao Ministério Público quando o Conselho Tutelar entender que
deverão ser realizadas novas diligências a cargo do Parquet. Caso
contrário, cabe a representação direta ao Juízo da Infância e da Juventude,
pois o procedimento para apuração de infração administrativa, a teor do art.
194 do ECA, se inicia também por representação do Conselho.
Colhe-se da jurisprudência do TJSP: "REPRESENTAÇÃO -
Conselho Tutelar - Legitimidade de parte - Medida tendente a apurar infração
administrativa cometida por genitor, por alegado abandono material e moral de
seu filho - Artigo 194 do Estatuto da Criança e do Adolescente - Recurso
provido" [10].
V - encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua
competência;
Os artigos 148 e 149 do ECA dispõem sobre a competência da
Justiça da Infância e da Juventude. No exercício de suas funções, os
conselheiros tutelares se deparam com situações que fogem de sua alçada,
notadamente quando se percebe o caráter litigioso do problema. Situação comum
é da criança que não tem registro de nascimento. O Conselho resolve outras
questões de sua competência, como a aplicação de medida protetiva, e
encaminha o caso ao Juízo competente para que, por meio do procedimento
adequado, determine a lavratura do assento.
VI - providenciar a medida estabelecida pela autoridade
judiciária, dentre as previstas no art. 101, de I a VI, para o adolescente
autor de ato infracional;
O dispositivo contempla a aplicação de medida protetiva,
pelo Conselho Tutelar, aos adolescentes autores de ato infracional, porventura
encaminhados pelo Juízo da Infância e da Juventude. As medidas são: I.
encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II.
orientação, apoio e acompanhamento temporários; III. matrícula e
freqüência obrigatórias em estabelecimento de ensino fundamental; IV.
inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à
criança ou adolescente; V. requisição de tratamento médico, psicológico ou
psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI. inclusão em programa
oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento à alcoólatras e
toxicômanos.
VII - expedir notificações;
Eis uma poderosa ferramenta de que dispõe o Conselho Tutelar
para bem exercer suas funções. Evidente que, para atendimento dos inúmeros
casos que lhe são apresentados, deverá convocar pais, adolescentes, servidores
públicos, responsáveis por entidades. Poderá notificá-los a comparecer em
sua sede, bem ainda a adotar providências para efetivação de direitos de
crianças e adolescentes ou mesmo para cessar violação a tais direitos. A
notificação também poderá ser utilizada para cientificar os destinatários e
beneficiários das medidas aplicadas. Pode-se notificar o diretor de escola
acerca da determinação de matrícula de criança ou os pais dessa criança
para que cumpram a medida aplicada, zelando pela freqüência do filho à
escola.
Observam Wilson Donizeti Liberati e Públio Caio Bessa Cyrino
que "a notificação poderá ser feita de maneira muito simples, em forma
de correspondência oficial, em impresso próprio, com o timbre do Conselho,
desde que contenha, claramente, o objetivo a ser atendido" [11].
Roberto Elias, por seu turno, assevera: "A expedição
de notificações, ao que nos parece, deve ser não só com relação aos pais e
responsáveis, para que apresentem seus filhos ou tutelados para serem ouvidos,
mas, também, em certos casos, às entidades que atendem menores, na cobrança
de alguma providência com respeito a menores, por força de medidas que foram
aplicadas. Percebe-se, claramente, que o legislador quis dar ao Conselho forças
para que realmente possa atuar em prol da criança e do adolescente. Cabe aos
seus membros, com sabedoria, utilizar aquilo que lhes confere o Estatuto, sem em
proveito único do menor, sujeito prevalecente de direitos" [12].
VIII - requisitar certidões de nascimento e de óbito de
criança ou adolescente quando necessário;
O Conselho Tutelar pode requisitar dos cartórios de registro
civil das pessoas naturais certidões de nascimento e de óbito, que deverão
ser fornecidas gratuitamente, em qualquer hipótese. Trata-se de medida adequada
para corrigir a falta do documento, situação mais comum do que possa parecer.
Inúmeras crianças e adolescentes encontram dificuldades para o exercício de
direitos básicos apenas porque não ostentam a certidão de nascimento e, na
maioria das vezes, seus responsáveis não têm condições de pagar pela
segunda via ou de ir até o cartório de origem, muitas vezes em municípios
distantes daqueles em que residem. Mesmo com as facilidades da vida moderna
(v.g. Cartório 24 horas, internet), a atuação do Conselho Tutelar,
nesse ponto, supre a falta do documento para crianças e adolescentes de
famílias simples e desprovidas de recursos.
Como explica Rose Mary Carvalho, nesse inciso "está
conferida ao Conselho Tutelar a atribuição de requisitar, quando necessário,
certidões de nascimento e de óbito, tendo em vista facilitar o desempenho de
suas atribuições em defesa dos interesses da criança e do adolescente, assim
como fazer valer o direito fundamental do indivíduo de ter sua certidão de
nascimento, já que o registro civil de nascimento é um direito não muito
respeitado em nosso país" [13].
Tais documentos serão expedidos independentemente do
pagamento de custas e emolumentos. Em outras palavras, a requisição será
atendida gratuitamente e, eventual negativa do cartorário, importará na
aplicação de penalidade administrativa, sem prejuízo de apuração de
ilícito penal.
Sobre a gratuidade, in casu, já se pronunciou o
Colendo Superior Tribunal de Justiça:
"Recurso ordinário. Mandado de segurança. criança e
adolescente. Regularização de registro. Isenção de pagamento. Lei nº
8.069/90. Provimento do Corregedor-Geral de Justiça do Rio Grande do Sul.
Legalidade. 1. Provimento do Corregedor-Geral de Justiça do Rio Grande do Sul
que, " ex vi " do art. 102, da lei 8.069/90, isentou de custas,
emolumentos e multa o fornecimento de certidões de nascimento e óbito para
regularização do registro de crianças e adolescentes, não é ilegal nem
abusivo. 2. Os serviços de registro, exercidos em caráter privado,
subordinam-se à natureza pública da sua prestação, sujeitando-se às regras
de fiscalização e providências corregedoras do poder concedente desses
serviços. 3. As requisições de certidões pelos conselhos tutelares são
isentas de pagamento, competindo ao Corregedor-Geral de Justiça editar
provimento a esse respeito. 4. Recurso ordinário conhecido e improvido"
[14].
O art. 102 do ECA prevê que as medidas protetivas aludidas
no art. 101 (da competência do Conselho Tutelar) serão acompanhadas da
regularização do registro civil. Sempre que o conselheiro tutelar constatar
que uma criança ou adolescente não possui registro de nascimento (que não se
confunde com a certidão de nascimento), deverá encaminhar o caso ao Juízo da
Infância e da Juventude, a quem compete requisitar o registro (art. 102, §
1º, ECA). Dessa forma, não cabe ao Conselho determinar a lavratura de assento
de nascimento. Ele apenas requisita certidões de nascimento ou óbito.
IX - assessorar o Poder Executivo local na elaboração da
proposta orçamentária para planos e programas de atendimento dos direitos da
criança e do adolescente;
Essa atribuição evidencia a relevância do Conselho Tutelar
no que concerne às políticas públicas voltadas aos interesses de crianças e
adolescentes. Afinal, saindo os conselheiros tutelares do seio da comunidade,
eles bem saberão as necessidades locais e reúnem condições para sugerir as
prioridades e definir os programas que melhor atendam os anseios e problemas de
seu meio.
Compete ao Poder Executivo municipal propor o orçamento e
submetê-lo à Câmara de Vereadores, obrigatoriamente prevendo recursos para
"planos e programas de atendimento dos direitos da criança e do
adolescente" e, segundo Edson Seda, "para essa propositura, o
Executivo deve se assessorar dos Conselhos Tutelares, os quais, recebendo
reclamações e denúncias sobre a não-oferta ou a oferta irregular de
serviços públicos obrigatórios, tem condições de informar ao Executivo onde
o desvio entre os fatos e a norma vem ocorrendo com freqüência" [15].
Paulo Afonso Garrido de Paula, por sua vez, obtempera:
"Como o Conselho Tutelar atende a casos individuais, via de regra
dependentes de assistência social, fazendo encaminhamentos para programas ou
serviços destinados a crianças e adolescentes lesados ou ameaçados de lesão
aos seus direitos fundamentais, acaba, em razão de suas funções, detendo
conhecimentos referentes às demandas e necessidades públicas na área de
infância e juventude. Desta forma, tem o dever de influir na elaboração da
proposta orçamentária, sugerindo ao Poder Executivo, inclusive através do
Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, ações que
permitam a universalização do atendimento àqueles que dele necessitem"
[16].
X - representar, em nome da pessoa e da família, contra a
violação dos direitos previstos no art. 220, § 3º, inciso II, da
Constituição Federal;
O artigo 220 da Constituição Federal dispõe que "a
manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob
qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição,
observado o disposto nesta Constituição". E no parágrafo 3º desse mesmo
artigo, fixa a competência de lei federal para "estabelecer os meios
legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de
programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no
art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam
ser nocivos à saúde e ao meio ambiente" (inc. II).
O mencionado art. 221 dispõe que a produção e a
programação das emissoras de rádio e televisão atenderão princípios da [I]
preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; [II]
promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente
que objetive sua divulgação; [III] regionalização da produção cultural,
artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei; e [IV]
respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, no art. 74,
estabelece: "O Poder Público, através do órgão competente, regulará as
diversões e espetáculos públicos, informando sobre a natureza deles, as
faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua
apresentação se mostre inadequada".
A regulamentação a respeito é feita pelo Ministério da
Justiça.
Eventual violação a essas regras caracteriza a infração
administrativa do art. 254 do Estatuto, in verbis: "Transmitir,
através de rádio ou televisão, espetáculo em horário diverso do autorizado,
ou sem aviso de sua classificação". Verificando tal situação, o
Conselho Tutelar deve representar ao Juízo competente para as providências
pertinentes.
XI - representar ao Ministério Público, para efeito das
ações de perda ou suspensão do pátrio poder.
Enquanto menores, os filhos estão sujeitos ao poder familiar
(art. 1630, Código Civil). Cabe a suspensão desse poder se o pai ou a mãe
abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os
bens dos filhos (art. 1637, CC), se qualquer deles for condenado por sentença
irrecorrível por crime, à pena superior a 2 anos de prisão (art. 1637, par.
ún., CC). A reiteração nessas faltas poderá ocasionar a perda do poder
familiar, o mesmo ocorrendo se o pai ou mãe castigarem imoderadamente ou deixar
o filho em abandono e praticarem atos contrários à moral e aos bons costumes
(art. 1638, CC). Também importa na perda ou suspensão do poder familiar o
descumprimento injustificado dos deveres de sustento, guarda e educação dos
filhos menores (art. 24, ECA).
Dos abusos cometidos pelos pais contra os filhos menores, o
Conselho Tutelar geralmente é a primeira instituição a tomar conhecimento.
Além das providências de seu cargo (aplicação de medidas protetivas,
tratamento, abrigamento etc), deverá, em sendo o caso, remeter relatório
circunstanciado ao Ministério Público, que detém competência para requerer
judicialmente a suspensão ou perda do poder familiar (arts. 155 e 201, III, ECA).
O art. 95 do Estatuto da Criança e do Adolescente confere ao
Conselho Tutelar competência (concorrente com o Poder Judiciário e Ministério
Público) para fiscalizar entidades governamentais e não-governamentais
responsáveis pela execução de programas de proteção e sócio-educativos
destinados a crianças e adolescentes, em regime de orientação e apoio
sócio-familiar, apoio sócio-educativo em meio aberto, colocação familiar,
abrigo, liberdade assistida, semi-liberdade e internação (cf. art. 90, ECA).
Para o exercício dessa atribuição, o Estatuto determina
que o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente comunique o
Conselho Tutelar sobre as entidades registradas e eventuais alterações (art.
90, par. ún.).
Verificando irregularidades, o Conselho Tutelar deverá
representar à autoridade judiciária, nos termos do art. 191, para apuração
dos fatos e imposição de penalidade.
É sempre oportuno lembrar, com arrimo em Wanderlino Nogueira
Neto, que "[...] os Conselhos Tutelares podem e devem fazer o que o
Estatuto e a lei municipal de criação autorizarem. Não podem agir segundo o
desejo dos seus integrantes ou dos demais operadores do sistema de garantia de
direitos. E, principalmente, não podem atuar para suprir ausências, faltas,
omissões de outros órgãos, como por exemplo de Vara do Poder Judicial, de
Órgão do Ministério Público, de Delegacia de Polícia, de Secretaria
Municipal de Ação Social, de Entidades governamentais e não governamentais de
proteção especial ou de socioeducação etc" [17].
Pertinente, sobre o tema, explicação de Wilson Donizeti
Liberati e Públio Caio Bessa Cyrino: "A fiscalização realizada pelos
membros do Conselho Tutelar não poderá limitar-se à simples verificação da
pedagogia do atendimento. Deverá, também, ser observadas a parte física do
estabelecimento, suas repartições, as condições de higiene e de saúde. Isso
se torna imprescindível quando se trata de entidade de atendimento que adote o
regime de abrigo ou internação [18].
Um comentário:
Olá amigos
Acabo de visitar o site. Fiquei encantado com o trabalho vosso. Não me recordo de ter visto algo similar.
Cumprimento vocês e os parabenizo pela iniciativa. Embora nunca tenha sido um CT, me considero um irmão, pois acompanhado o trabalho do CT Junqueirópolis desde a criação, em 1995, e e vejo as dificuldades, que são semelhantes em todos os lugares.
Por gostar tanto, meu trabalho de conclusão de curso (Direito), tratou do tema "CONSELHO TUTELAR - ASPECTOS JURÍDICOS". O assunto rendeu.
Um grande abraço a todos.
Clóvis Mendes
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